O CARÁTER PUNITIVO DA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL (PUNITIVE DAMAGES) E SUA APLICABILIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

artigo

Anderson de Araujo da Silva

Sumário: Resumo. 1. Conceito e Evolução histórica dos ‘punitive damages’; 1.1 Dos ‘punitive damages’ no direito norte americano; 1.2 Dos ‘punitive damages’ no direito pátrio; 1.3 Da problemática acerca da aplicabilidade das indenizações punitivas nas relações de consumo; 2. Proteção dos consumidores por meio dos ‘punitive damages’ 3. A Posição do STJ; 4. Conclusão; 5. Referências.

RESUMO

Nos países em que vige o sistema da ‘Commom Law’, em especial os Estados Unidos da América, tem-se o uso do instituto chamado de “punitive damages”, ou seja, danos ou indenizações punitivas, cuja finalidade é majorar o valor indenizatório, a um patamar maior que o valor do dano, com a finalidade não só indenizar a vitima, mas também o de punir o ofensor e desestimulá-lo a reiterar-se em condutas danosas. Ainda que o nosso sistema da responsabilidade civil não tenha sido pensado para acolher tal instituto, sua aplicação tem sido aceita e defendida por parte da doutrina e da jurisprudência, embora com reservas.

O Código de Defesa do Consumidor chegou a versar sobre ‘punitive damages’ em seu art. 16, todavia, o referido artigo foi objeto de veto. Tratava-se da previsão de uma multa civil aplicada pelo magistrado, nas ações ajuizadas em defesa do consumidor, cujo máximo equivalia a um milhão de vezes o valor do Bônus do Tesouro Nacional, levando-se em conta a gravidade e a extensão do dano causado e o poderio econômico do agente. Na mesma esteira, os artigos 15 e 45 do Projeto de Lei, foram vetados.
Ainda assim, é possível verificar que a tendência jurisprudencial, cada vez maior, é a de que a indenização por dano moral possui uma dúplice finalidade, a de compensar a vítima e punir o ofensor.

1. Conceito e Evolução Histórica dos Punitive Damages

O instituto das indenizações punitivas ou ‘punitive damages’ tem por finalidade, majorar o valor das indenizações como forma de punição, de modo a desestimular as condutas ofensivas e evitar que outras pessoas sejam de igual modo, lesadas, trata-se de uma sanção civil aplicada pelo magistrado.

No âmbito das relações de consumo, que é o cerne deste trabalho, as indenizações punitivas têm o condão de reparar o dano, bem como, surtir o necessário efeito pedagógico, majorando as indenizações para que esta reflita no patrimônio do fornecedor, de modo que este por sua vez, promova uma profunda mudança em sua política de tratamento aos clientes, para evitar que outros consumidores sejam de igual modo, prejudicados.

Encontra-se na doutrina, diferentes nomenclaturas para este instituto, tais quais; Teoria do Desestímulo, Indenização pedagógica, indenização punitiva, ‘exemplary damages’, etc., todavia, no presente trabalho se utilizará os termos ‘punitive damages’ e indenização punitiva.

Há notícias acerca da existência dos ‘punitive damages’ nos ordenamentos jurídicos da antiguidade, tais como o Código de Hammurabi, o Código Hitita a Lei das XII Tábuas (450 a.C) e o Código de Manu.

Nesses ordenamentos jurídicos da Antiguidade, a idéia de vingança privada imperava.
Na Lei das XII Tábuas, é possível observamos o caráter punitivo da indenização no caso de algumas situações como a do depositário infiel, os que cobram dinheiro a juros superiores a 1% ao ano, os que não cumprem a promessa feita, o que utiliza madeira de outrem sem o seu crivo, o que consagra coisa litigiosa e o que obtiver posse provisória com má-fé, conforme as tábuas a seguir;

“TÁBUA TERCEIRA
1. Se o depositário, de má-fé, praticar alguma falta com relação ao depósito, que seja condenado em dobro.
2. Se alguém colocar o seu dinheiro a juros superiores a um por cento ao ano, que seja condenado a devolver o quádruplo.
TÁBUA SEXTA
1. Se alguém empenhar a sua coisa ou vender em presença de testemunhas, o que prometeu terá força de lei.
2. Se não cumprir o que prometeu, que seja condenado em dobro.
8. Que a madeira utilizada para a construção de uma casa, ou para amparar a videira, não seja retirada só porque o proprietário reivindicar, mas aquele que utilizou a madeira que não lhe pertencia seja condenado a pagar o dobro do valor; e se a madeira for destacada da construção ou do vinhedo, que seja permitido ao proprietário reivindicá-la.
TÁBUA DÉCIMA SEGUNDA
2. Se alguém fizer consagrar uma coisa litigiosa, que pague o dobro do valor da coisa consagrada.
3. Se alguém obtiver de má fé a posse provisória de uma coisa, que o pretor, para pôr fim ao litígio, nomeie três árbitros, que estes condenem o possuidor de má fé a restituir o dobro dos frutos.”
Em que pese a existência das previsões legais na antiguidade, os primeiros julgados a que se tem registro da aplicação deste instituto encontram-se no direito inglês, nos idos de 1763, em especial no julgamento do caso Wilkes v. Wood.

Wilkes versus Wood tratou-se de uma demanda judicial proposta por John Wilkes pedindo a condenação em ‘punitive damages’ em face do subsecretário de Estado Inglês, Mr. Wood, por conta de um mandado genérico de prisão por ele emitido e supervisionado, que autorizava a prisão dos suspeitos de publicar um artigo anônimo no jornal semanal ‘The Noth Briton’ que criticava e difamava a honra do Rei George III. Desta feita, os mensageiros do Rei prenderam quarenta e nove pessoas, dentre as quais o senhor Wilkes, bem como, invadiram sua residência e em busca de provas, forçaram suas gavetas e apreenderam livros e documentos pessoais sem inventariá-los.

Por força disso, Wilkes ajuizou uma ‘action of tresspass’ (ação de transgressão) em face de Mr. Wood pleiteando uma indenização e no eito de suas considerações argumentou que uma indenização de baixo valor não seria suficiente para impedir que o subsecretário reiterasse tais condutas, naquela oportunidade o júri acolheu seus argumentos e condenou Mr. Wood em £1000 (mil libras) a título de ‘punitive damages’ valor considerável na época.

Desta forma, a aplicação da ‘punitive damages’ no caso em epígrafe, foi realizada em repúdio ao abuso de poder de um funcionário de alto escalão do Rei George III.

Atualmente, o referido instituto tem sido adotado nos países da Common Law, tendo como um dos principais expoentes os Estados Unidos da América, onde há notícias de condenações em indenizações milionárias com o intuito de garantir o respeito aos direitos alheios.

1.1 Dos ‘Punitive Damages’ no Direito Norte Americano.

Cabe salientar que o presente capítulo, tem o fito de ilustrar como funcionam os ‘punitive damages’ no direito norte americano aplicados na prática, não se trata de uma sugestão de modelo a ser adotado em nosso país, mas sim utilizar como paradigma um dos maiores expoentes do referido instituto na atualidade, e isso é possível de se aferir em noticiários e filmes no âmbito jurídico, que nos dão uma leve noção.

Nos Estados Unidos da America, a indenização punitiva é uma verba julgada separadamente, do qual os jurados através de uma ficha de votação opinam se a conduta do réu foi reprovável (por meio de dolo ou culpa), se em maioria de votos, os jurados entenderem que positivamente, a ‘punitive damages’ será aplicada e a verba será fixada a este título.

Ocorre que neste país, acabou se tornando notória a aplicação de indenizações exorbitantes, como no famoso caso Stella Liebeck versus Mc Donald’s, naquela oportunidade, a senhora Stella Liebeck de 79 anos, ingressou com uma demanda em face da famosa rede de ‘fast food’, Mc Donald’s, requerendo uma indenização pelo fato de ter adquirido num estabelecimento da referida lanchonete via ‘drive-through’ um café, todavia o mesmo lhe fora servido tão quente, que causou queimaduras em sua pele.

Desta forma, o júri, considerando este fato, e a existência de outras 700 reclamações acerca da temperatura em que o café era servido pela rede de ‘fast food’, condenou a empresa ao pagamento de uma indenização no valor de US$ 2.7 milhões de dólares.

Outro caso célebre foi BMW of North America versus Gore, naquela ocasião, Gore Jr. Moveu uma ação contra a BMW pelo fato de ter verificado que esta havia lhe vendido um veículo recondicionado como se fosse novo.

O júri de Birmingham julgou procedente a ação e, além de deferir o pagamento de US$ 4.000,00 a título de danos morais compensatórios, fixou como indenização punitiva a quantia de US$ 4 milhões de dólares.

Todavia, a suprema corte do Estado do Alabama e posteriormente a Suprema Corte Norte Americana, consideraram desproporcional a indenização fixada, e a reduziu para US$ 50 mil dólares, tal julgado criou precedente importante naquele país, pois passou-se a discutir a existência da desproporção entre os danos e as indenizações até então fixadas.

Por conta disto, no ano de 1995 a ‘House of Representatives’ votou e aprovou um projeto de lei que visava limitar as indenizações ao valor de US$ 250 mil dólares, porém o referido projeto foi objeto de veto pelo presidente na época, Bill Clinton.

Desta forma percebe-se que a função punitiva tem um patamar privilegiado no referido país, bem como, que com isso conseguiu-se assegurar o respeito aos direitos do consumidor, pautado no temor às indenizações.

De outra banda, acabou por contribuir com a proliferação de demandas indenizatórias estapafúrdias de pessoas que queriam locupletar-se à custa do poder judiciário e das grandes empresas.

1.2 Dos ‘Punitive Damages’ no Direito Pátrio

Conforme mencionado anteriormente, nosso direito não fora pensado para acolher tal instituto, todavia, sua aplicação tem sido defendida por parte da doutrina e da jurisprudência, todavia, não se aplicam as indenizações vultuosas como ocorre nos Estados Unidos por exemplo.

Em nossa jurisprudência, se verificam indenizações arbitradas em valores modestos, haja vista que aqui se impera o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, princípio este que não é observado nos Estados Unidos.

A título de exemplo transcrevemos os seguintes julgados do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

RESPONSABILIDADE CIVIL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. Consumidor que adquiriu câmera fotográfica digital pela “Internet”, na denominada “Black Friday”, no final do mês de novembro. Produto entregue apenas após o ajuizamento da demanda, depois de passadas as festividades de Natal, ano novo e férias escolares. Devida a reparação dos danos morais decorrentes da frustração e aborrecimento sofridos pelo consumidor. Responsabilidade objetiva do fornecedor pelos danos causados ao consumidor, decorrentes da má prestação de serviços (art. 14, do CDC). Indenização por danos morais fixada em R$ 3.000,00 Na hipótese dos autos, diante do aborrecimento e da frustração sofridas pelo consumidor, tendo como parâmetro os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, deve o quantum indenizatório, diante das especificidades da causa, ser arbitrado no montante de R$ 3.000,00, monetariamente corrigido a partir da data desta decisão colegiada, e com a incidência de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação (art. 406, do CC/2002), valor este que indeniza o Autor sem locupletá-lo à custa do Poder Judiciário, servindo, por outro lado, para punir e desestimular reiteradas condutas ilícitas praticadas pela Ré.

Ação de indenização. Prestação de serviço de energia elétrica. Suspensão indevida. Ausência de qualquer justificativa para a interrupção que perdurou por dois dias. Dano moral caracterizado. Serviço contínuo (art. 22, CDC). Valor arbitrado monocraticamente razoável à hipótese. Apelo improvido. (…) A finalidade da reparação moral é dupla, inexistindo qualquer lesão ao princípio da reserva legal em sanções cujo objetivo é inibir a repetição de fatos semelhantes, além de compensar a vítima. E a origem maior de nosso artigo 5º, incisos V e X, da C. Federal é, igualmente, o “punitive damages” ou “exemplary damages” do direito norte-americano, o que justifica fixação em montante não irrisório, para efetivamente desestimular o ofensor, mas vedada também a quantificação exacerbada, que possa enriquecer injustamente a vítima. Postas tais premissas, tem-se como razoável e proporcional aos danos causados o montante arbitrado monocraticamente, de R$ 10.000,00, notadamente ante a condição econômica da ofensora.

Com a análise dos julgados acima transcritos, é possível se verificar que aplicação do referido instituto por parte de nossos tribunais, são bem diferentes do paradigma norte americano, o que nos deixa o seguinte questionamento; será que os valores arbitrados, são realmente suficientes para inibir reiteradas condutas lesivas das grandes empresas?

1.3 Da Problemática Acerca da Aplicabilidade das Indenizações Punitivas no Ordenamento Jurídico pátrio.

Feitas as considerações acerca do conceito e evolução histórica do referido instituto, bem como, da ilustração do que ocorre nos Estados Unidos e no Brasil, cumpre refletir acerca da efetiva aplicação deste à luz do ordenamento jurídico pátrio.

Como se observou na leitura dos julgados supra transcritos, as indenizações em solo pátrio são arbitradas sob o fundamento genérico de uma compensação do dano e punição do agente, sem, de fato, expor como esta decisão atingiria, efetivamente, cada um desses objetivos.

Abre-se margem a inúmeros equívocos, como confusão entre o valor destinado à compensação e o da punição, o que, quase sempre, acaba inviabilizando a correta aplicação do caráter punitivo em decorrência do princípio da vedação do enriquecimento sem causa.

Para ilustrar a alegação, analisemos o seguinte caso hipotético;
Sabe-se que o magistrado, em obediência à ordem constitucional e às normas processuais, é obrigado a abordar no corpo de sua sentença as razões de seu convencimento.

Assim, imaginemos que um juiz de determinada comarca, analisando uma lide, se convence da existência de dano moral perpetrado por uma empresa de grande porte e em face da gravidade, arbitra como indenização, o valor de R$ 20 mil reais e assevera que, destes R$ 20 mil, 5 mil são de caráter compensatório e 15 mil serão a título punitivo e dissuasório.

O réu, neste caso, poderia manejar o Recurso de Apelação para atacar justamente a parte da sentença que alavanca o caráter punitivo, alegando violação dos princípios do enriquecimento sem causa, violação do princípio da reserva legal e etc. para ver reformada a sentença pelo Tribunal competente.

Todavia, ainda no caso hipotético, se o magistrado, ao expor as razões de seu convencimento, não alavanca o caráter punitivo da indenização, e simplesmente expõe que os R$ 20 mil reais são pura e simplesmente compensatórios, caberá ao réu manejar recurso para a sua minoração, mas boa parte de sua tese jurídica em relação à hipótese anterior, se esvai.

Isto se deve, provavelmente, à falta de disposição legal que discipline o caráter punitivo da indenização, de modo que se torna por deveras difícil mensurar qual seria o valor da punição, bem como mensurar o valor do desestimulo.

Se confrontarmos a doutrina da indenização punitiva com o princípio da vedação do enriquecimento sem causa, que é o acréscimo injustificado no patrimônio de uma pessoa física ou jurídica, outro ponto que acaba nos chamando atenção é a destinação do valor arbitrado a titulo de punição, pois enquanto o caráter compensatório gira em torno do ofendido, o punitivo está ligado à punição e desestímulo do agente propriamente dito.

Nesse ínterim, Barbosa Junior citando Maria Celina Bodin de Moraes aduz que;

Nestes casos [de aplicação da indenização punitiva], porém, o instituto não pode se equiparar ao dano punitivo como hoje é conhecido, porque o valor a maior da indenização, a ser pago “punitivamente”, não deverá ser destinado ao autor da ação, mas, coerentemente com o nosso sistema, e em obediência às previsões da Lei nº 7.347/85, servirá a beneficiar um número maior de pessoas, através do depósito das condenações em fundos já especificados.

Depreende-se deste raciocínio, que a indenização punitiva não deve ser revertida em favor da vítima, sob pena de se fazer vingar o enriquecimento sem causa.

Ademais há quem entenda que não se trataria de enriquecimento sem causa, pois o autor da demanda indenizatória, agiria também como uma espécie de “promotor público privado” e, por isso, merece a recompensa, pois mesmo que em nome próprio, pleiteou de forma secundária, o desestímulo da conduta lesiva em outras pessoas, contribuindo assim, com a melhoria do mercado de consumo.

Ainda, há autores, que entendem que em nosso ordenamento jurídico há menos riscos do que no norte-americano de trazer indenizações exorbitantes. Isto porque, não estaria a indenização nas mãos de um júri popular, composta de pessoas leigas juridicamente, e sim sob o manto de juízes capazes e competentes, bem como, resguardado pelo escudo do princípio do duplo grau de jurisdição.

Porém há entendimentos que rechaçam inteiramente a aplicabilidade das indenizações punitivas no Brasil, como AMARAL e SGARBI;

Sem que seja necessário mencionar teses que atribuem ao caráter punitivo das medidas uma feição criminal, incorrendo sua aplicação em pena sem prévia cominação ou usurpação de competência dos magistrados criminais pelos magistrados cíveis, é de fácil constatação a incompatibilidade de tal entendimento com as regras insculpidas na legislação civil vigente.
Nosso sistema não apenas determina que a indenização mede-se pela extensão do dano, mas também veda o enriquecimento sem causa e impede que qualquer pessoa seja compelida a cumprir algo senão em virtude de lei, sendo estes pontos categóricos para compreensão de tal incompatibilidade aplicativa.

Para os autores, estaria o magistrado, impedido de fixar indenizações punitivas, tendo em vista o princípio da legalidade e da vedação ao enriquecimento sem causa.

2. Da Proteção dos Consumidores Por Meio Dos ‘Punitive Damages’

O cerne do Código de Defesa do Consumidor é a defesa da parte mais fraca da relação de consumo, ou seja, o consumidor.

Nesta senda, encontramos posições doutrinárias que defendem a aplicação das indenizações punitivas como forma de proteção dos consumidores.

A este respeito, Arthur Luis Mendonça Rollo citando Newton de Lucca;

Ninguém suporta mais o descalabro ético da sociedade brasileira. A classe empresarial – diz-nos com propriedade o escritor e empresário Mario Ernesto Humberg – possui a grande responsabilidade de liderar a mudança ética no País, mostrando que a “roda do futuro começa a girar de forma diferente”, e asseverando que alguns empresários “já estão sensibilizados para essa responsabilidade

Os fornecedores conhecem os direitos dos consumidores e conhecem suas obrigações, mas ainda assim, se valem de sua superioridade econômica, para lesar clientes através de práticas abusivas e negar-lhes justas reivindicações na esfera administrativa, o que faz com que estes inúmeros consumidores sejam levados a ter de ingressar com demandas judiciais, o que contribui para a morosidade processual que existe atualmente, vez que dão início a inúmeros conflitos que demoram por demais para serem resolvidos.

Desta forma, mostra-se extremamente relevante a proteção dos consumidores, comando insculpido na carta magna.

A este respeito, leciona Rollo;

O caminho para isso é emprestar caráter punitivo às indenizações individuais, fazendo doer no bolso deles, a fim de que percebam que, também sob o ponto de vista econômico, não vale a pena continuar adotando as mesmas práticas.
Não são raras as vezes em que o magistrado se depara com demandas que envolvem um mesmo réu, geralmente grandes empresas em ações com pedidos semelhantes de um grande número de seus clientes, como por exemplo, em casos de negativação indevida nos cadastros de inadimplentes, levando a crer que um efeito limitador da aplicação dos ‘punitive damages’, impede que se efetive de fato a função inibitória dos danos morais, e que a reiteração do ilícito seja muitas vezes mais favorável ao réu que a não-reiteração. Nota-se portanto que as decisões no sentido de limitar as indenizações, reduz ou mesmo retira dos danos morais a sua função punitiva, não atingido em cheio a Dignidade da Pessoa Humana, mas arranhado profundamente o senso de justiça do consumidor.

A aplicação das indenizações punitivas traria ao vitimado, bem como à sociedade, a sensação de que seus direitos como consumidor estão sendo respeitados, e de que terão uma efetiva proteção conforme previsto na Magna Carta.

Impende salientar também, as repercussões econômicas trazidas pela aplicação do referido instituto, nesse caminhar leciona Humberto Theodoro Junior;

O “custo Brasil”, destarte, se agrava por obra de tal postura jurisprudencial. É uma ilusão pensar que se podem extrair do meio produtivo reparações mirabolantes sem que isto deixe de influir sobre a economia nacional. O mundo econômico é formado por vasos comunicantes. Tudo o que se exige de sacrifício dos meios de produção transforma-se incontinenti em custos dos bens produzidos. Quem irá responder por esses custos majorados é a sociedade consumidora como um todo. Se o empresário onerado não conseguir repassar o custo para os preços finais, seu negócio se arruinará, e mais uma vez quem suportará a consequência mais grava será a sociedade, porque do desestímulo à produção lucrativa decorrem, imediatamente, o fechamento de empresas, a redução de empregos e a escassez de produtos indispensáveis

Nesta linha de raciocínio do doutrinador, a aplicação irrestrita dos ‘punitive damages’ de modo a onerar em demasia os fornecedores, certamente aumentaria ainda mais os riscos da atividade econômica explorada, o que elevaria os custos dos produtos e serviços, e estas indenizações em valores mirabolantes, seriam repassados ao consumidor, tornando-se verdadeiro desestímulo às avessas.

3. Posição do Superior Tribunal de Justiça

O Superior Tribunal de Justiça, ao menos em tese, considera admissível, ainda que com reservas, a aplicação das indenizações punitivas, o que pode ser observado em julgados como estes;

O critério que vem sendo utilizado por esta Corte Superior na fixação do valor da indenização por danos morais, considera as condições pessoais e econômicas das partes, devendo o arbitramento operar-se com moderação e razoabilidade, atento à realidade de vida e às peculiaridades de cada caso, de forma a não haver o enriquecimento indevido do ofendido, bem como que sirva para desestimular o ofensor a repetir o ato ilícito. Ressalte-se que a aplicação irrestrita das ‘punitive damages’ encontra óbice regulador no ordenamento jurídico pátrio que, anteriormente à entrada do Código Civil de 2002, vedava o enriquecimento sem causa como princípio informador do direito e após a novel codificação civilista, passou a prescrevê-la expressamente, mais especificamente, no art. 884 do Código Civil de 2002

DANOS MORAIS. PRESSUPOSTOS FÁTICOS. RECUSO ESPECIAL. SÚMULA 7-STJ. QUANTUM. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. (…omissis…). 2. (…omissis…). 3. . . . em casos semelhantes, em que há inscrição ou manutenção indevida de nome de pretenso devedor em cadastro de inadimplentes, esta Corte tem fixado a indenização por danos morais em valor equivalente a cinqüenta salários-mínimos.

O STJ vislumbra necessidade de rever o valor estabelecido a título de indenização por danos morais caso estes sejam fixados em patamares irrisórios ou exagerados.

O cuidado do STJ nesse sentido é perceptível, uma vez que afasta a exigência dos critérios de admissibilidade exigidos ao Recurso Especial e estabelecidos nas alíneas do inciso III do Art. 105 da Constituição Federal de 1988, para evitar que o valor das indenizações sejam fixados de forma exagerada ou irrisória pelos juízes e tribunais inferiores.

Vale salientar que a função punitiva, nada mais é do que um efeito secundário da sentença, e portanto deve ser utilizado em casos específicos à serem analisados no caso concreto.
Nesse caminhar, é possível aferir que o Superior Tribunal de Justiça adotou a função punitiva das indenizações por danos morais tomadas as devidas precauções de que o valor arbitrado não seja exagerado. Além disso, o STJ avocou para si a função de uniformizar os julgados e evitar que indenizações desproporcionais transitem em julgado e gerem precedente incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro.

4. CONCLUSÃO

Conforme proposta, o presente trabalho traçou um panorama geral acerca do dano moral, da indenização punitiva, e o estudo sobre sua compatibilidade com o ordenamento jurídico nacional no âmbito das relações de consumo.

Impende salientar, que a previsão expressa da indenização por dano moral é tema relativamente novo em nosso ordenamento jurídico, o que torna o papel da doutrina e da jurisprudência de extrema relevância para lhe definir, bem como traçar o seu alcance e limitações no caso concreto.

Neste caminhar o caráter punitivo da indenização, que é tema mais novo do que a própria previsão expressa do dano moral no ordenamento jurídico pátrio, nada mais é do que uma criação doutrinária e jurisprudencial, haja vista a inexistência de disposição legal.

Trouxemos à baila, pensamentos contrários e favoráveis à admissão do caráter dúplice das indenizações, tais quais, o de reparar o dano e o de punir o ofensor.

A doutrina favorável embasa sua tese principalmente no disposto no art. 6º, IV do CDC, que consagra o princípio da prevenção de danos ao consumidor, sob a ideia de que uma indenização em valor superior ao necessário para a simples reparação, surtiria o efeito pedagógico aos fornecedores, sendo que haja vista o valor fixado em grande monta, faria com que o fornecedor procedesse a mudança em sua política de atendimento ao consumidor, para que tais danos fossem evitados.

A posição contrária, por sua vez, fulcra seu inconformismo com o instituto, principalmente com base no princípio da legalidade e na vedação ao enriquecimento sem causa, sob a linha de raciocínio de que uma indenização em valor superior ao valor do dano como forma de punição civil ao fornecedor, fere a regra de que não há pena sem prévia cominação legal, haja vista a ausência de disposição legal acerca da função punitiva da indenização.

Ademais, entende a referida corrente, que o caráter punitivo, viria a trazer ao indenizado, uma situação de aumento injustificado de seu patrimônio, vez que estaria a obter vantagem financeira em face da punição de outrem.

Nesta toada, há a posição do STJ, que defende a aplicação do caráter punitivo, todavia com reservas, haja vista que o valor deve se pautar no binômio razoabilidade e proporcionalidade, de modo a evitar a ruína financeira dos fornecedores e o enriquecimento sem causa dos consumidores.

A nosso ver perece correto o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, pois se engana quem acredita que a indenização punitiva fere o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, isto porque, no montante em que a mesma é fixada no Brasil (que é bem inferior ao que é aplicado no paradigma norte americano) não é suficiente para enriquecer o consumidor, tampouco trazer uma mudança substancial e injusta em sua situação econômica.

Embora os valores fixados, num primeiro momento, não aparentem ser suficientes para refletir no patrimônio da empresa de modo que esta seja inibida de reiterar-se em ofensas, entendemos que a soma dos montantes arbitrados em várias demandas deduzidas por consumidores, estaria sim a refletir sobre o patrimônio desta, para surtir o efeito desejado.

Todavia, infelizmente, poucos são os consumidores que ingressam em juízo para requerer sua justa indenização, seja por que não conhecem seus direitos, seja por que não possuem interesse em passar por todo um processo judicial desgastante e moroso, como infelizmente é o nosso, de modo que muitas vezes é vantajoso para o fornecedor, lesar seus clientes e obter vantagem econômica com práticas abusivas.

Ademais, não entendemos que a função dúplice da indenização por dano moral, seria capaz de ferir o princípio da legalidade, haja vista que o Art. 5º da LINDB, dispõe que o juiz ao aplicar a lei, deve atender aos fins sociais a que ela se destina e as exigências do bem comum.

Neste caminhar, uma indenização com caráter punitivo estaria em consonância com os fins sociais e exigências do bem comum, haja vista que somos uma sociedade de consumo, e como tal, merecemos ser tratados com respeito e distinção pelos fornecedores, que em muitas vezes se aproveitam de sua vantagem técnica e econômica para lesar clientes.

Este comportamento deve ser exemplarmente punido pelos magistrados, isto para que a própria empresa condenada, não reitere nas condutas lesivas, bem como, sirva de exemplo para as demais.

Não se acredita que com a aplicação dos ‘punitive damages’, estariam resolvidas todos os anseios do consumidor, até por que sabemos que estas indenizações tendem a ser tratados como custo operacional das grandes empresas, todavia, poderia ser um empurrão para novas iniciativas dentro da esfera administrativa dessas empresas, para um profunda reforma em sua política de tratamento com os clientes, porém isto seria um novo estudo, pois o nosso se encerra aqui.

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Anderson de Araujo da Silva é advogado atuante no contencioso cível.

Artigo de teste

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